Neurociência do consumo busca aperfeiçoar pesquisas da publicidade.

Estudo procura mostrar que uso de ferramentas da neurociência traz maior rigor e confiabilidade para pesquisas por fazer emergir relatos do inconsciente.

Normalmente, questionários são elaborados pelas mais variadas marcas com o intuito de extrair as preferências e as opiniões dos consumidores, para traçar os perfis de quem adere a determinado produto ou serviço. Entretanto, a aplicação de auto relatos e entrevistas não se coloca mais como uma alternativa eficaz, já que o cliente pode não contar tudo ou o que realmente acha. Atentando-se para essa falha, as ciências cognitivas, corrente forte e profundamente trabalhada nos Estados Unidos, destacam esse lado oculto do comprador. Com esse pensamento em mente, amparada na área da psicologia dentro do consumo, Bruna Seibert Motta trabalha a utilização de um mecanismo intitulado neurociência do consumo na publicidade.

Influenciável, eu?

A publicitária parte do princípio de que os indivíduos não admitem, com facilidade, que são influenciados por forças externas ao decidirem adquirir ou não um objeto: “As pessoas não gostam de dizer que elas sofrem influência para consumir”. Motta relembra que, ao elaborar um teste sobre esse tema, colheu um resultado contraditório: “33% de uma mostra de 450 pessoas disseram que não [sofriam influência de compra]. Mas, nas perguntas seguintes, quem eram [no formato de] ‘dentro dessas opções, de zero a cinco, quão você é influenciado?’, ninguém respondeu zero e pouquíssimos responderam um”. Portanto, conclui-se que os sujeitos sabem que fatores como amigos, família, qualidade, preço e sites como o “Reclame Aqui” são levados em conta no momento em que uma escolha é feita. Para a pesquisadora, essa disparidade nos feedbacks deve-se ao fato das pessoas desejarem “ter o controle sobre a decisão delas”. “Ok que ouvi meu amigo sugerindo que eu comprasse o Samsung Galaxy em vez do iPhone, porém a decisão final foi minha”, diz. O indivíduo exemplificado, então, crê que não foi influenciado, pois bateu o derradeiro martelo sozinho e camufla as dicas e os conselhos ouvidos anteriormente.

 

 

Instrumentos da neurociência do consumo

Com o desejo de captar relatos do subconsciente e amenizar as imprecisões e as perdas de informações oriundas dos depoimentos voluntários, Bruna lança mão da neurociência do consumo. A esfera, que une o marketing com a ciência, utiliza alguns métodos como o eye tracking (dispositivo que mede as posições e os movimentos dos olhos), o eletroencefalograma EEG (analisa a atividade elétrica cerebral espontânea), a ressonância magnética fMRI (detecta variações do fluxo sanguíneo de acordo com a atividade neural) e o IAT (mede a força das associações automáticas de um sujeito entre representações mentais de objetos ou conceitos na memória). A doutoranda explica: “São formas de rastrear tanto as ondas cerebrais quanto as imagens do cérebro através da ressonância, além da responsividade das pessoas por intermédio do IAT, que é um sistema no qual são dadas respostas que estão no inconsciente”. O subconsciente é revelado porque a abordagem do IAT é feita de uma maneira rápida, pois deve-se responder, para a direita ou para a esquerda, em dois botões. A estudiosa cita a estrutura de uma indagação sobre racismo: na tela, aparecem brancos, negros, palavras positivas e termos negativos. Se os negros forem colocados, por exemplo, do lado direito, o mecanismo mediará a tendência do avaliado em relacionar os vocábulos ruins à direita, mesmo quando estes surgirem na esquerda. Caso essa relação seja frequente, tem-se um alguém propenso a ser racista. Entretanto, a pesquisadora ressalta que questões como essa precisam ser trabalhadas de modo ético, pois não dá para prender um indivíduo sob a alegação de seu teste no IAT ter apresentado um caráter racista.

                                                                                 

Bruna defende que a aplicação dos mecanismos da neurociência melhora a qualidade dos estudos e a forma como o consumidor é entendido. “Quero usar essas ferramentas para ver o quanto o auto relato está sendo sinérgico com o que, supostamente, está no subconsciente”. Para isso, a pesquisadora recorre aos questionários tradicionais e aos instrumentos detalhados acima, tecendo pontos de comparação. Em uma primeira parte, pretende apresentar um vídeo ou uma revista que tenha um conteúdo de cunho social ou ecológico. Depois, perguntará, fazendo uso de todos os aparatos citados, se os indivíduos preferem um item da Avon, marca que tende a salientar o aspecto da beleza, ou da Natura Ecos, a qual possui um apelo socioambiental. O mesmo teste será aplicado em outro grupo, sendo que este terá visto, antes, um material de entretenimento, sem características sociais ou em prol do ambientalismo. “Se eu olhei uma revista que fala sobre ecologia, tendo a escolher produtos que foquem nisso, mesmo que o preço seja um pouco mais alto”, comenta a publicitária. Assim, ao avaliar as diferentes respostas, construirá um quadro acerca do comportamento dos consumidores, destacando as influências e a ativação da memória e das emoções. Além disso, pontos como a bagagem cultural e a realidade dos participantes também serão ponderados.

Fonte (USP)


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